O Médico Tem Conselho. O Fotógrafo Tem Que Se Defender.

Por que um médico pode cobrar caro sem ser questionado — e um fotógrafo precisa justificar tudo? Neste texto, Luis H. Minaré expõe a diferença brutal entre profissões amparadas por conselhos e aquelas que precisam criar sua própria autoridade, todos os dias. Uma reflexão afiada sobre estrutura, percepção de valor e o peso de ter que se defender... só por fazer arte.

Luis Henrique Minaré

7/29/20252 min read

Por que um médico pode cobrar caro, ser respeitado e ainda gerar fila de espera —
sem precisar justificar nada?

E por que um fotógrafo, ao apresentar um orçamento justo, precisa explicar cada linha, cada centavo, cada clique?

A resposta não está apenas na competência.
Está na estrutura.

A medicina tem um sistema que valida, protege e legitima.
A fotografia, não.

1. O Conselho dá respaldo. O fotógrafo trabalha exposto.

O Conselho Federal de Medicina (CFM):

  • Define o piso ético da profissão

  • Controla a formação, a publicidade, os registros

  • Aplica sanções e regula comportamentos

  • Dá ao profissional força institucional

O resultado?

Mesmo um médico mediano é percebido como “alguém com saber legítimo”.
A tarifa mínima está “autorizada” pela categoria.
Ele não precisa provar valor — ele parte dele.

2. Na fotografia, cada um cria sua própria régua

  • Não há conselho

  • Não há piso mínimo

  • Não há ética padronizada de divulgação

  • Não há respaldo legal contra contratos ignorados

O que nasce disso?
Um mercado caótico, autofágico e desleal.

Um fotógrafo com 30 anos de estrada cobra R$3.500.
Outro, recém-comprador de uma mirrorless, vende “sessão com 100 fotos” por R$120.

E quem tem dignidade parece arrogante.
Quem se posiciona é acusado de elitismo.

3. O fotógrafo precisa ser tudo — ou não sobrevive

Enquanto o médico tem:

  • CRM

  • Conselho de Classe

  • Sindicato

  • Convenções

  • Planos de carreira

O fotógrafo tem:

  • Inbox com “quanto fica só 3 fotos?”

  • Plataformas que disputam quem entrega mais por menos

  • Clientes que comparam seu trabalho com filtros do Instagram

E pior: outros fotógrafos validam isso, dizendo que “o mercado é assim mesmo”.

É a própria classe desvalorizando o ofício, por medo de perder cliente.

4. E o conhecimento fotográfico? Invisível.

O saber do fotógrafo é:

  • empírico

  • sensorial

  • construído na prática

  • emocionalmente sofisticado

  • mas... não certificado

Isso o torna invisível para o olhar leigo.

É por isso que:

  • O cliente acha que paga pela câmera

  • Confunde rapidez com facilidade

  • E trata técnica como “exagero artístico”

5. Conclusão

A medicina tem corpo.
A fotografia ainda é alma sem abrigo.

Enquanto o médico é legitimado pela instituição,
o fotógrafo precisa construir sua legitimidade no olhar de cada cliente.

E isso exige:

  • Narrativa clara

  • Posicionamento firme

  • Processos éticos

  • Coragem de cobrar o justo

  • E um mercado que pare de se sabotar por R$50 a menos